MÍDIA E PODER

Comissão de Ética Pública investiga ida de Parente para RBS
A Comissão de Ética Pública decidiu investigar a contratação do ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, para o cargo de vice-presidente executivo da RBS, maior grupo de comunicação do sul do país. Segundo a Folha de São Paulo, decisão foi tomada após a publicação de uma matéria sobre o caso no site da Agência Carta Maior.

Marco Aurélio Weissheimer


A Comissão de Ética Pública, integrada por seis conselheiros nomeados diretamente pelo presidente da República, decidiu investigar o caso da contratação do ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, para o cargo de vice-presidente executivo da Rede Brasil Sul de Comunicação (RBS), maior grupo de comunicação do Sul do País. Segundo matéria publicada na edição desta quarta-feira (dia 27) da Folha de São Paulo, a comissão decidiu reexaminar o caso após a publicação de uma notícia no site da Agência Carta Maior sobre a suposta participação do ministro na elaboração da Medida Provisória 70, que alterou as regras de controle das empresas de radiodifusão. A MP, aprovada em 2 de outubro, favorece os grupos que concentram muitas concessões de radiodifusão, como é o caso da RBS. Segundo especialistas da área, a medida também facilita a captação de investimentos pelos grandes conglomerados de radiodifusão.

Pedro Parente foi liberado, pela Comissão de Ética Pública, da quarentena exigida para os funcionários públicos de primeiro escalão que pretendem passar para a iniciativa privada. O argumento utilizado para a liberação de Parente foi o de que ele estaria indo trabalhar em uma área estranha à sua área de atuação como chefe da Casa Civil do Governo Fernando Henrique. Atualmente, 52 funcionários do primeiro escalão do governo federal estão sujeitos à quarentena, quando ficam impedidos de assumir emprego no setor privado por 120 dias, a partir da exoneração do cargo público. Como vice-presidente executivo, Parente será responsável pela gestão e operação de todas as empresas do grupo RBS -seis jornais, 24 emissoras de rádio e 17 emissoras de TV.



A gênese da MP 70

A matéria publicada pela Agência Carta Maior, no dia 9 de novembro, reconstituiu a gênese da MP 70, a partir de um levantamento realizado pelo site AcessoCom, (www.acessocom.com.br), especializado na área de mídia. Segundo essa fonte, o texto que regulamenta o tema foi enviado à Casa Civil sob a forma de anteprojeto de lei. Entrou como anteprojeto e saiu como medida provisória com um novo artigo, que flexibilizou o limite de propriedade de emissoras de rádio e TV, beneficiando diretamente grupos empresariais de mídia como a RBS.

Citando o serviço de notícias "Teletime News", AcessoCom lembrou que o conglomerado da família Sirotsky é uma das empresas de mídia que controla, por meio de seus acionistas, “o maior número de outorgas em um mesmo Estado e para quem a MP 70 poderia ser de maior serventia”. O "Teletime News" assinalou, na época, que o gabinete da Casa Civil participou diretamente da formatação da MP nº 70, editada em 1º de outubro. Conforme essas fontes, após ser alterada na Casa Civil, a MP recebeu um novo artigo estabelecendo que “participações de até 20% de capital (não havendo participação em conselho e diretoria) não estão sujeitas aos limites impostos pelo Decreto 236/67 para o total de outorgas de radiodifusão (no máximo duas em cada Estado, por grupo, até o limite de cinco outorgas de VHF)”. Esse artigo possibilita que fundos de investimento e de pensão, nacionais ou estrangeiros, adquiram qualquer quantidade de emissoras de rádio ou TV, respeitado o limite de participação acionária. Ainda segundo o Teletimes News, a RBS, proprietária de outorgas no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, “é uma das empresas de mídia que tem, por meio de seus acionistas (a família Sirotsky), o maior número de outorgas em um mesmo Estado e para quem a MP 70 poderia ser de maior serventia”.

Segundo a matéria da Folha de São Paulo, o presidente da comissão, João Geraldo Piquet Carneiro, enviou ofício ao ministro das Comunicações, Juarez Quadros, na semana passada, perguntando se Parente participou da elaboração da medida provisória 70, que alterou as regras de controle das empresas de radiodifusão. Segundo Piquet Carneiro, a decisão foi tomada com base na declaração de Parente de que “não havia tido contato relevante com a RBS nos seis meses que antecederam o convite para o emprego”. Com a liberação da quarentena, o ministro anunciou sua ida para a RBS, onde começará a trabalhar no dia 1º de fevereiro de 2003.

Perguntas da Comissão

O ofício encaminhado pela Comissão de Ética Pública ao ministro das Comunicações contém as seguintes perguntas:

1) Que área do governo tomou a iniciativa de propor a MP 70?

2) A RBS encontra-se entre as empresas efetiva ou potencialmente afetadas pela MP?

3) Quem participou da elaboração e discussão da proposta até sua definitiva aprovação pelo presidente da República?

4) Qual o papel específico desempenhado pelo ministro Pedro Parente no processo de discussão e aprovação da MP 70?

As mesmas perguntas foram encaminhadas à Secretaria Geral da Presidência da República. O ministério das Comunicações e o Palácio do Planalto ainda não responderam à comissão, que deve se reunir, dia 5 de dezembro, para reexaminar o assunto. A Comissão de Ética Pública também quer saber se Parente foi convidado para o cargo diretamente pelo grupo de comunicação gaúcho ou através de uma empresa de colocação de executivos (as chamadas “hed hunter”). No site institucional da RBS, a direção da empresa diz que ele foi contratado por intermédio da empresa SpencerStuart.

Segundo a Folha de São Paulo, “a polêmica em torno da MP 70 foi provocada pela inclusão de uma cláusula que permite a participação de investidores em até 20% do capital das emissoras de radiodifusão, fora dos limites de concentração de propriedade estabelecidos pela legislação”. Pela legislação em vigor desde 1967, nenhum acionista pode ter mais de duas emissoras de TV por Estado, ou mais de seis rádios FM no país. A família Sirotsky, proprietária do Grupo RBS, tem 12 concessões de TV no Estado do Rio Grande do Sul e cinco em Santa Catarina, registradas em nome de empresas de diferentes membros da família.

Quando a contratação de Pedro Parente pela RBS foi anunciada, no início de novembro, o ministro Juarez Quadros disse que o texto da MP havia sido redigido pelo Ministério das Comunicações. Segundo o presidente da Comissão de Ética Pública, a investigação sobre o caso tem o objetivo de aperfeiçoar a conduta ética. "Estamos agindo com cautela. Se fosse um ministro setorial seria mais fácil aferir se teve participação direta em determinado caso. A Casa Civil tem abrangência muito grande", admitiu à Folha.